sexta-feira, 13 de abril de 2007

Coluna do Aquiles - 04/07

Belamente Hermínio
Por Aquiles Rique Reis*

Hermínio Bello de Carvalho continua merecedor de homenagens tão diversas quanto merecidas. A mais recente se materializou no livro "Timoneiro", que traz encartado o CD "Manuscrito Sonoro". Escrito pelo jornalista Alexandre Pavan, "Timoneiro" (Casa de Palavra) confirma o que muitos já sabiam: são plurais os bellos; são poderosos os carvalhos; são muitos os hermínios.

Desde sempre Hermínio é um poeta de múltiplas idéias – ama-as todas com o ardor que cultiva o encanto de vê-las florescer por suas mãos de jardineiro. Ele que nasceu para ter lampejos de descobridor, inúmeros são os tesouros que trouxe à cena por seu carinhoso labutar.

Pelo texto caloroso e cuidadoso de Pavan, o leitor de "Timoneiro" acompanha o crescimento do menino Hermínio; chega com ele à adolescência; percorre com ele os corredores da Rádio Nacional do Rio de Janeiro e vê sua aproximação dos ídolos da época. Enfim, compreende que ali nascia o que logo seria a marca registrada de Hermínio Bello de Carvalho: sua capacidade de seduzir e encantar os que dele se acercam.

É belo constatar que a vida do poeta Hermínio é feita de amizades profundas. Daquelas que se constroem pelo dia-a-dia no trabalho e, mais do que isto, forjadas no amor que viceja entre os que se fascinam com as qualidades daqueles com quem convivem. Assim cresce Hermínio.

Certo de que nada pode e nem deve se resumir ao momento fugaz em que acontece, ele cunhou uma sentença que melhor ilustra sua personalidade – “resíduo cultural”: nenhum fato cultural pode acontecer sem que algo o ajude a se perenizar. Qualquer gesto ou ação, toda idéia há de ser levada a cabo, mas tendo como preocupação ficar para os que virão depois e dela se aproveitarão. Pensa Hermínio que nada deve ficar para trás. Tudo tem de seguir seu curso revelando belezas, incentivando desdobramentos, abrindo caminhos... Bela é a história de vida deste intenso multiplicador cultural. Comoventes são seus dias movidos à paixão. Luminares são seus projetos.

Hermínio bolou e Kleber Santo dirigiu o espetáculo Rosa de Ouro. Um show que juntou no palco do Teatro Jovem, no Rio de Janeiro, Aracy Cortes, Paulinho da Viola, Elton Medeiros, Nelson Sargento, Jair do Cavaquinho e aquela que logo se transformaria na sensação daqueles conturbados tempos pós-instalação da ditadura militar, Clementina de Jesus. Descoberta por Hermínio, mãe Quelé fazia tremer a platéia no pequenino Teatro Jovem.

Daí em diante, muitas iniciativas que resultaram em discos e shows históricos tiveram as marcas da cabeça revolucionária e das mãos mágicas de Hermínio Bello de Carvalho. Ações culturais sempre relevantes, nunca óbvias; projetos invariavelmente definitivos, jamais fugazes, contaram com as idéias desta usina de sonhos que atende pelo nome de Hermínio Bello de Carvalho.

Alexandre Pavan nos descreve carinhosamente a trajetória do poeta da brasilidade mais escancarada, mais despudoradamente rica que aqui se exibe; relata-nos o que nomeou de Herminices – causos que se somam a fatos vividos pelo poeta e bem demonstram o humor, o talento, a capacidade de fazer amizades, o jeito de Hermínio idealizar desbragadamente os mais variados projetos culturais e pô-los em prática. Sempre como um ato de fé na tradição do povo em quem tanto crê.

Temas que poderiam causar algum tipo de constrangimento, como homossexualidade, são abordados naturalmente – como de resto não poderia deixar de ser, em se tratando de pessoas sensíveis e inteligentes.

Em "Timoneiro", tudo se torna palavra amorosa a serviço de traçar o perfil biográfico de uma das personalidades culturais mais importantes do Brasil dos séculos XX e XXI.

Os sonhos de Hermínio estão voltados para o futuro. Visam à juventude com quem hoje convive na Escola Portátil de Música. Mocidade que vai sucedê-lo e da qual não se cansa de desfrutar o frescor, enquanto a abastece com a sabedoria de quem constrói a história digna de um livro: Timoneiro!

*Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4, amigo e fã de Hermínio Bello de Carvalho